Levantaram-se ao nascer do sol, enfiaram
a primeira roupa de lhes apareceu pela frente, engoliram o pequeno almoço e
lançaram-se para a rua em azafama, com se nada mais importasse. Conduziram os seus
carros em fúria, negaram prioridades no trânsito, estacionaram em cima dos
passeios e correram em direção às lojas, desenfreados, atropelando novos e velhos, deficientes
e crianças. Passaram por cima de toda a folha para, já em manada tipo gnus, se
apertarem contras as grades das lojas, esperando o tiro de partida para o
assalto final. Era o Black Friday.
O filósofo Jean-Jacques Rousseau
(1712-1778), defendeu que o homem se constituía como uma entidade naturalmente
boa e que seria no processo civilizacional
que se corrompia e se afastava da sua verdadeira natureza, transformando-se,
por vezes, numa besta quadrada, a que Trump
pode servir de exemplo deveras ilustrativo…
Eu sempre duvidei dessa natureza boa.
Sempre desconfiei que o homem já nasce com um ligeiro instinto bélico, mas
independentemente do momento em que nos tornámos verdadeiros aninais, o que conta
é que de facto somos, na maioria do tempo, umas bestas uns para os outros.
Sempre fomos!
O homem é a espécie animal mais prematura
e imatura, a mais dependente e a que mais depende à nascença das condições ambientais
e dos cuidados dos seus progenitores. É também por isso, por essa infância prolongada, por essa oportunidade
relacional de grande proximidade que o homem encontra as condições para
evoluir e se destacar dos demais animais. Foi na relação que o homem primitivo
progrediu e se emancipou, tornando-se homo sapiens .
Na verdade o ponto de viragem de tudo isto foi a
descoberta da linguagem, a partir da qual o homem ganhou a capacidade de transmitir
conhecimento adquirido e acumulado a lugares e tempos distantes. Antes o homem não passava de um animaleco somente
capaz de grunir e gesticular no momento os
poucos instintos que possuía.
Estima-se que há cerca de 100 mil anos o
contingente de homens primitivos modernos no planeta não seria mais de 50 mil gatos
pingados espalhados pelo continente africano e médio oriente. Isto, depois dos
homens primitivos modernos europeus, ao fugirem da vaga de frio na europa, irromperem por
Africa abaixo e dizimarem os tristes africanos. Era a primeira prova da boa
relação Europa e Africa!
Com tanta zaragata e pancadaria estima-se que há 50
mil anos a população de homens modernos não ultrapassaria os 5 mil indivíduos. Na
verdade, como todos se dedicavam à caça e a colecta de plantas e outros
alimentos, como nada se acumulava e nada havia para trocar, sempre que grupos
diferentes se encontravam era um "deus nos acuda" e porrada de meia noite! Ou seja,
nunca houve condições para florescer nenhum sentimento de simpatia pelo outro diferente nesta época! Ontem, tal como hoje, o homem tem muita dificuldade em tolerar a diferença!
Segundo Lawrence H. Keeley (1947-2017) a
sociedade tribal perdia em média 0.5% da sua população em combates pela posse
de alimentos todos os anos. Isto aplicado aos tempos modernos representaria
cerca de dois biliões de mortes ano. É obra!
Na verdade, o homem sempre foi fiel à sua
genética, à sua aprendizagem social e às suas circunstâncias competitivas e sempre respondeu à letra a
toda e qualquer ameaça real ou presumida. O black friday foi apenas o último
pretexto para o homem exercitar e se transformar no animal das cavernas que sempre foi!
Depois da abolição da escravatura, do
fim oficial dos regimes e das politicas de segregação racial, da implementação de
politicas de proteção e inclusão dos mais fracos, dos pactos de não agressão e da adopção do discurso do
politicamente correcto, entre outros polimentos, eis que ao dobrar da esquina estala o verniz e ressurgem
de forma fervorosa os "velhos" discursos populistas, que reintroduzem a natureza humana no seu melhor e dão vida às questões e clivagens históricas que sempre acompanharam a humanidade – racismo, nacionalismos, xenofobismos,
homofonismos e outros ...ismos
congéneres.
É sobretudo na época de escassez, das crises económicas, financeiras, sociais e políticas, que emerge no homem as suas características mais primitivas, de luta e fuga, de defesa e ataque! Na verdade o homem não perde uma oportunidade para manifestar o seu lado competitivo, animalesco, selvagem e cego.
É sobretudo na época de escassez, das crises económicas, financeiras, sociais e políticas, que emerge no homem as suas características mais primitivas, de luta e fuga, de defesa e ataque! Na verdade o homem não perde uma oportunidade para manifestar o seu lado competitivo, animalesco, selvagem e cego.
A black friday, importada dos EUA e inspirada, ao que dizem, num dos episódios
mais tristes da humanidade - a promoção na venda de escravos, foi apenas mais um pretexto
para o homem revelar, as entranhas da sua genética, o seu instinto animal, o resultado da sua boa
socialização! Estúpida irracionalidade!