quarta-feira, 25 de abril de 2012

Porque hoje é Abril

Ontem, numa grande superfície comercial em Coimbra, testemunhei algo impensável há algum tempo! Uma mulher pediu um quarto de frango churrasco e batatas fritas no balcão da gastronomia. Ao receber a encomenda, olhou para o preço do frango e de olhos desesperados disse para a empregada – “Desculpe, o frango custa quase 2€! Não o posso levar. Levo só a batatas”

O Ostracismo foi decretado em Atenas no ano de 510 A.C. por Clístenes e foi posto em prática no ano 487 A.C. Era uma forma de punição que impunha a expulsão política e o exílio por um período de 10 anos aos políticos que houvessem proposto projectos e votações para benefício próprio ou que fossem, de alguma forma, perigosos para o interesse do estado. Os seus bens eram confiscados e o exilado, subtraído de todos os seus bens, tornava-se forasteiro.

O primeiro político punido com o ostracismo foi Hiparco e mais tarde os políticos Megacles e Jantipo, pai de Péricles. No ano 482 A.C. foi a vez de Aristides. Ao que parece o último punido foi o demagogo Hipérbolo no ano 417 A.C.

A votação era feita inicialmente pela assembleia de Atenas. Se a votação tinha como resultado voto favorável ao ostracismo então uma votação pública era feita dois meses mais tarde. Se o resultado final fosse confirmado o político tinha 10 dias para deixar a cidade. Poderia voltar depois de 10 anos ou se outra assembleia seguida de votação pública trouxesse perdão.

Em Atenas, o ostracismo contribuiu para a manutenção da república.

Estava aqui a pensar, nesta data comemorativa dos 38 anos de democracia em Portugal, num cenário hipotético - o que aconteceria a alguns dos mais importantes políticos portugueses caso o ostracismo tivesse sido praticado em Portugal?

José Sócrates por certo viveria em Paris, mas em vez estudar filosofia, trabalharia provavelmente na construção civil. No lugar de ter milhões em offshore teria que suar 12 por dia para não morrer de fome.

E Dias Loureiro? Será que o dono do actual maior resort da ilha do sal em Cabo verde manteria esse estatuto e privilegio? Ou andaria descalço à pesca da lagosta para vender a turistas?

O que aconteceria a Vítor Constâncio depois de em 2010, ano em que errou nas previsões macroeconómicas, acompanhou o Governo Português na negação da crise e falhou na regulação bancária, ao actuar tardiamente nos casos BPN e BPP, que custaram aos contribuintes portugueses um montante superior a 9.500 milhões de euros? Seria nomeado vice-presidente do Banco Central Europeu ou seria um competente faxina desse mesmo banco, servindo café aos senhores do dinheiro?

Cavaco Silva seria presidente da república ou operador de máquinas nas obras públicas de Angola, a construir auto-estradas, de que tanto gosta, com o seu amigo Jorge Coelho?
E Durão Barroso? O desertor! Manteria o actual estatuto ou seria condenado ao ostracismo por traição ao seu próprio país.

E os outros todos que lesaram o país em benefício próprio ou em nome de interesses instalados, com os quais tinham promiscuidades pecaminosas?

Mas não. Eles continuam por aí, titulares de todos os seus bens, direitos, benefícios e mordomias. Hoje sairão à rua com o cravo vermelho à lapela e gritarão viva Abril, viva a liberdade!

Amanhã a tal senhora voltará à grande superfície comercial e tentará inventar uma nova refeição?

Até quando vamos ser coniventes com esta democracia da treta?




segunda-feira, 23 de abril de 2012

Rota das adegas




Imagino o que terão pensado os outros 399 participantes, equipados com os seus modelos topo de gama, com travões a óleo e suspensões integrais, quando me viram chegar com a minha Delfina, bicicleta de marca branca, modelo de 2009 que comprei por 60€ num pacote que incluía ainda um capacete, uma t-shirt, duas sandes de torresmos e um sumo! Estriei-a à altura numa demorada viagem entre Miranda do Corvo e Coimbra, na qual ela com um pedal partido, me mandou fazer quase metade do caminho a pé. A coisa prometia portanto!
A primeira ameaça que recebi da organização e de outros concorrentes foi a de que em caso de furo ou avaria ninguém tinha uma peça sequer compatível com a minha maldita bicicleta. Não me amedrontei! Afinal o meu objectivo estava claramente definido.
Como os primeiros 25 quilómetros eram cronometrados, na partida, encostei-me estrategicamente à berma para deixar passar aqueles cavalos de corrida, não fossem eles abalroar-me e impedir-me de alcançar o objectivo.
A primeira vitima foi o meu amigo Pedro Monteiro, agora presidente do Turismo Centro de Portugal, quiçá mais habituado à pose fotográfica que ao todo o terreno, rapidamente se estatelou contra uma pedra, ferindo-se irremediavelmente num joelho, forçando-o a abandonar.
Ao longo desses terríveis primeiros 25 quilómetros fui ultrapassado por várioas dezenas de concorrentes, mas para regozijo meu, com a minha Delfina ainda segura de si, passei também por uns quantos com as suas máquinas furadas ou avariadas, o que criou em mim um sentimento contraditório, se por um lado não era o último, por outro deixou-me uma certa insegurança. Afinal se furasse no meio daquelas vinhas sem fim, a que hora chegaria ao objectivo – A bucha!
O primeiro abastecimento estava situado na aldeia da Pena. Com uma ementa variada que começava no bacalhau assado e continuava com cabidela de leitão, umas divinais iscas de fígado, porco no espeto, charcutaria assada diversa, etc, etc... No que concerne ao estado líquido contamos com a presença dos stands das empresas Quinta de Baixo, Sogrape – com o espumante Mateus rosé e a Quinta do Encontro. Decidi-me por umas iscas de fígado que confrontei com vinhos espumantes dos três produtores, salientando-se o bom nível de todos os vinhos, em especial a superior harmonia da Quinta de Baixo, que me encheu as medidas. Sublime!
Por mim ficava ali eternamente agarrada à isca e ao copo, mas tinha de partir! Esbocei um primeiro arranque em grande estilo mas eis que dou de caras com a miss Maxmen 2010, Barbara Brandão, madrinha da prova. Quase cai! Envergonhado abortei a descolagem, não fosse ela troçar e desdenhar da minha Delfina.
Quando cheguei a casa fui à net ver as fotos da Barbara Brandão, que não conhecia, e fiquei abismado como uma produção fotográfica pode transformar uma mulher bonita, sem dúvida, numa autêntica deusa! A verdade é que se também a minha Delfina fosse ao Photoshop, a coisa chiaria mais fino! Mas ninguém quer saber!
Condenado a ser o último, lá me quedei mais um pouco pelo espaço a beber mais uns flutes da Qta de Baixo enquanto aguardava que aquelas bestas de duas rodas partissem.
Mais 15 quilómetros de puro todo o terreno e todos os meus receios se confirmavam - a puta da bicicleta começava finalmente a ceder … o pedal voltou a portar-se mal! O mesmo! Com galhardia fiz-me à estrada apenas com um pedal e um objectivo na cabeça - chegar ao objectivo II – A bucha na aldeia da Póvoa da Lomba.
Aqui manteve-se a gastronomia regional mas mudaram os vinhos – desta vez marcavam presença as Caves Montanha, a Adega Coop de Cantanhede e o incontornável Mário Sérgio com a sua Quinta das Bageiras.
A apenas a alguns quilómetros da meta, descansados, eu e o meu amigo Décio Matias e mais uns quantos irredutíveis amigos por ali ficamos esquecidos a contemplar os prazeres do ananás com presunto e a pasta de queijo na broa sempre acompanhados pelo arrebatador espumante Quintas da Bageiras baga 2009. Edílico!
Os restantes cinco quilómetros foram pouco menos que tortura. Com a bicicleta toda partida e o corpo dorido e a roçar a bebedeira, arrastei-me até à meta e ao banho frio. Por especial cortesia do último fiquei em penúltimo!


Retemperados, seguimos para a Adega Cooperativa de Cantanhede, onde enfrentamos galhardamente o estaladiço leitão à bairrada massivamente regado com Marquês de Marialva espumante reserva 2009.


Esta rota das adegas é para repetir, mas para a próxima vou a pé que chego mais depressa!

terça-feira, 3 de abril de 2012

Ideias de merda!


Desta vez corri o mini-trail de Almourol. Porque corro? Corro para não estar parado. Para não morrer de tédio! Corro porque sou um corredor e os corredores foram feitos para correr! Mas desta vez as pernas não foram na cantiga e simplesmente não quiseram correr. Arrastaram-se dessincronizadas. Órfãs de comando. O divórcio foi total!
Desta vez a cabeça saltitou vadia por outras serras. Nem os cús das gajas pareciam ser capazes de me animar! Pareciam-me deformados. Descaídos! Transfigurados pela minha mente enviesada. Um olhar inquinado!
Desta vez também nada de competição com o sexo oposto, que a minha amiga Vera, avalisada psicóloga clínica, disse-me, a propósito do texto “Enfim gajas”, que eu meti competição onde devia ter metido amor. Fiquei fodido. Com ela, claro!
Os vinte e cinco quilómetros da corrida de Almourol foram a prova do poder da mente humana. Só pensava em merdas! E como só pensava em merda, de tanto pensar meteu-se-me na cabeça que tinha de me livrar dela.
Devia, por conseguinte, cagar!
Convenci-me que só cagando teria aquela performance felina e elegante que me distingue como corredor! Aquilo era uma ordem e eu cumpro sempre uma ordem! Nos dez quilómetros seguintes a minha cabeça só parecia capaz de pensar em merda. Uma obsessão. Dez quilómetros iguais a tantos outros em que pensei nas PPP´s, nas EDP´s, nas Galp´s, nas Scut´s, no Sócrates e noutros finórios do género. Merda. Apenas merda! Do simbólico ao concreto.

Um homem sonha, a obra nasce.
A determinada altura tive que me lançar repentinamente para um canavial! Que mal tem? Outros cagam e mijam em lugares mais bizarros! E enquanto lá estava agachado ouvi passar dezenas de gajos. Lindo!
Nos restantes quilómetros, convencido que estava finalmente limpo, corri desalmadamente como um rapaz novo, até que me lembrei outra vez das pernas. Parei instantaneamente! Estanquei, com se alguém me tivesse desligado abruptamente da corrente. Pensei ainda em mais merdas. Merdas e mais merdas. Há dias assim. Há dias em que simplesmente um homem tem que fazer um esforço sobre-humano para rolar…
Finalmente, a maldita meta, enrolada em curvas e contracurvas sem fim como se estivesse escondida num novelo! A puta. Pouco depois mais uma desilusão. Encontrei uma gaja conhecida a poucos metros da meta e, enquanto a cumprimentava, fui ultrapassado por dois gajos. Fiquei em 102º lugar! Um dia para esquecer!
Depois de correr vinte e cinco quilómetros a pensar em merda, deprimi!
A organização deveria ter o bom senso de, em vez de marmelada, biscoitos, bananas e outras banalidades, ter colocado à minha disposição uma embalagem de Prozac ! Más organizações, é o que são!
Desesperado decidi embebedar-me! Outra desilusão. Não havia cerveja à borla como na prova anterior! Maldita crise que impede até um homem de se embebedar num dia para esquecer!
Já resignado, encontrei o meu amigo Álvaro Calado, psicólogo clínico. Por momentos pensei que a organização se lembrara de me arranjar um profissional de saúde, especialista em depressões pós corrida. Mas não, o meu velho companheiro vinha por conta propria! Apaziguei-me. E juntos comemoramos mais um reencontro! E um bom reencontro é tudo!


Aviso: Este texto é pura ficção, podendo no entanto estar aqui e acolá enriquecido por factos reais!