"Não tenho filhos e tremo só de pensar. O exemplo que vejo em volta não aconselha temeridades. Hordas de amigos constituem as respectivas proles e, apesar da benesse, não levam vidas descansadas. Pelo contrário: estão invariavelmente mergulhados numa angústia e numa ansiedade de contornos particularmente patológicos. Percebo porquê. Há cem ou duzentos anos, a vida dependia do berço, da posição social e da fortuna familiar. Hoje, não. A criança nasce, não numa família mas numa pista de atletismo, com as barreiras da praxe: jardim-escola aos três, natação aos quatro, lições de piano aos cinco, escola aos seis, e um exército de professores, explicadores, educadores e psicólogos, como se a criança fosse um potro de competição.
Eis a ideologia criminosa que se instalou definitivamente nas sociedades modernas: a vida não é para ser vivida - mas construída com sucessos pessoais e profissionais, uns atrás dos outros, em progressão geométrica para o infinito. É preciso o emprego de sonho, a casa de sonho, o maridinho de sonho, os amigos de sonho, as férias de sonho, os restaurantes de sonho.
Não admira que, até 2020, um terço da população mundial esteja a mamar forte no Prozac. É a velha história da cenoura e do burro: quanto mais temos, mais queremos. Quanto mais queremos, mais desesperamos. A meritocracia gera uma insatisfação insaciável que acabará por arrasar o mais leve traço de humanidade. O que não deixa de ser uma lástima. Se as pessoas voltassem a ler os clássicos, sobretudo Montaigne, saberiam que o fim último da vida não é a excelência, mas sim a felicidade!
O autor deste texto é o jornalista João Pereira Coutinho e fez imediatamente eco em mim. Tinha escrito neste mesmo blog em Setembro que “… nos vamos emulando no “ruído” infernal do dia-a-dia em nome de uma pretensa realização futura. Uma realização plena assente quiçá numa boa condição financeira, numa excelente carreira profissional e em mais não sei quantas coisas grandiosas. É em nome dessa expectativa que nos vamos afastando do essencial e das coisas simples. Acreditamos cegamente que essa concludente vitória final nos conduzirá à felicidade plena. Tudo o que é pequeno ao pé dessa brutal felicidade é insignificante e como tal desvalorizado. “… Vivemos numa sociedade em que todos temos de ter sucesso, ser bonitos, magros e felizes, não podendo sequer sentir-nos tristes...”
Volto a este assunto para chamar a atenção para uma nova prol de pequenos ditadores que por aí anda – Os nossos filhos, esses mesmo! Os gajos têm tudo! Quererem tudo, não têm tolerância a nada! Devem achar que nós quanto tínhamos a idade deles tínhamos direito a aulas de natação, música, ginástica, judo, ballet, televisão no quarto, jogos na Playstation, Magalhães com internet, etc.
Esses gajos têm até o monopólio do computador do pai e da mãe que se vêm gregos para lá pôr o cú. Esses sim são uns verdadeiros reis, habituados a ter tudo. E os pais felizes e orgulhosos por darem o que nunca tiveram. Assim vamos nós rumo ao futuro da humanidade! Que futuro?
Esta nova geração de pais corre o risco de se tornar na última que obedeceu aos seus pais e na primeira a obedecer aos seus filhos! Uma lástima!
O que vai acontecer a esta prol de meninos quando no mundo adulto perceberem que afinal as coisas não caem do céu? Quantos psicólogos e outros mágicos serão necessários para curar tamanhas feridas. Quantos quilos de droga serão precisos para aliviar tamanha dor. Quantos litros de vinho?
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