Júlia
tem 38 anos, é casada e mãe de dois filhos já adolescentes. Casou cedo com o
primeiro e único namorado. Foi sempre muito “agarrada” à sua mãe, que perdeu há
mais ou menos um ano. Apesar de todo o seu afecto pela sua progenitora, nunca
lhe tinha dito em vida o quanto a amava. Júlia era uma mulher defendida e
fechada nos afectos. Uma linguagem que dominava mal. No dia da morte da mãe
encontrava-se fora em trabalho e não tivera oportunidade de se despedir ou
sequer tempo para um último beijo em vida!
O
seu casamento já vivera melhores dias, suspeitava inclusivé que o seu
companheiro pudesse ter uma relação extraconjugal. Os filhos, absorvidos pelas suas
carreiras académicas e profissionais, pouco tempo passavam em casa.
Júlia
deprimiu. Deprimiu gravemente, apresentava um discurso vazio, sem projectos ou
sentido de vida consistentes e sobretudo uma recorrente ideação suicida,
valorizada pela equipa terapêutica, que se arrastou por algumas semanas. Júlia
nunca o disse claramente, mas alimentava o secreto desejo de se juntar à sua
mãe.
A
equipa terapêutica perante o diagnóstico e sobretudo pela reserva do prognóstico,
manteve-se vigilante e foi ao longo das sessões dando suporte à paciente.
Algumas
sessões mais tarde o director, quando sentiu que Júlia estava emocionalmente mais
preparada propôs-lhe duas dramatizações:
Numa
primeira sessão pediu-lhe que dramatizasse no cenário (palco) uma última
conversa com a mãe. Júlia escolheu o elemento feminino mais velho do grupo, que
fez de sua mãe e iniciou-se o diálogo, com recurso à
técnica de inversão de papéis.
A Júlia pode dizer à mãe tudo o que sentia e tudo
o que tinha ficado por dizer. Já no lugar da mãe, disse o que
pensava que a mãe diria. A conversa teve uma enorme intensidade emocional. Júlia pode despedir-se finalmente da mãe.
Numa
segunda sessão, atendendo à ideia recorrente de suicídio de Júlia, o director
propõe-lhe que se realizasse o seu próprio velório. Já que ela queria tanto
morrer!
Ela simbolicamente
morta, deitada no palco, cheia de flores por cima e coberta com um manto de
seda preto (parte dos materiais obrigatórios), ouviu durante alguns minutos os
outros elementos do grupo (egos auxiliares) nos papéis do pai, do marido e dos
dois filhos, dizerem frases chave, devidamente instruídos pelos egos
profissionais e director.
Depois
de muitas provocações, o ego auxiliar que representava o papel da
filha grita: “Como foste capaz, sua cobarde! Como pudeste deixar-me sem mãe!
Gosto tanto de ti! Precisava tanto de ti!
De
súbito, Júlia dá um salto e grita “ Merda, merda eu não quero morrer! A ideação
suicida parou.
O
psiquiatra romeno Jacob Levy Moreno, foi o criador do Psicodrama e do
Sociodrama. Moreno nasceu em Bucareste, na Roménia em 1889 e faleceu nos EUA em
1974. Contemporâneo de Freud, do qual cedo se demarcou ideologicamente, foi um exemplo
de criatividade e dedicação à investigação psicológica e social, deixando uma
obra escrita reconhecida e um movimento psicodramático fortemente implantado
nos EUA, América do Sul e Europa. Moreno propôs uma especie de fusão entre o teatro espontâneo e a psicologia.
O psicodrama é uma terapia individual, realizada em grupo, que através de uma teoria, de instrumentos e técnicas específicas permite aos pacientes dramatizar (dar movimento, dar vida) ao seu mundo interno num cenário (palco). Não se tratando de teatro, porque aqui o protagonista representa os seus próprios papéis, é possível por à “luz do dia”, as suas angústias, medos, frustrações, fantasias etc…
O psicodrama é uma terapia individual, realizada em grupo, que através de uma teoria, de instrumentos e técnicas específicas permite aos pacientes dramatizar (dar movimento, dar vida) ao seu mundo interno num cenário (palco). Não se tratando de teatro, porque aqui o protagonista representa os seus próprios papéis, é possível por à “luz do dia”, as suas angústias, medos, frustrações, fantasias etc…
A
sessão de psicodrama tem três fases. A primeira comporta dois momentos, o aquecimento
inespecífico, na qual o director procura seleccionar o protagonista e o
aquecimento específico, em que o director se foca já sobre o elemento que vai
dramatizar. Segue-se então a dramatização em que o director convida o
protagonista a subir ao cenário, procurando que ele reconstitua nesse espaço
todo o contexto da sua vivência, tornando-a assim visualizável.
Na
última fase fazem-se os comentários. Tal como o público, no teatro ou na vida,
comenta o desempenho dos protagonistas, no psicodrama também o auditório se vai
pronunciar sobre a dramatização, dando informações para uso futuro do
protagonista. O grupo é ele próprio um agente terapêutico. Seguem-se os
comentários dos egos profissionais e por fim o do director, a quem cabe encerrar a
sessão.
A
acção terapêutica do psicodrama resulta, em grande parte, do jogo entre
protagonista e egos auxiliares que decorre durante a dramatização. Porém para
que isso possa acontecer, o psicodrama dispõe de um certo número de técnicas.
As principais são a inversão de papéis, solilóquio, interpolação de
resistências, técnica de espelho, duplo, representação simbólica, objecto
intermediário e estátua. São técnicas secundárias a auto-apresentação, Átomo
social, role playing e jogos dramáticos.
Na
lápide de Moreno está inscrito “ Aqui jaz o homem que trouxe a alegria à
psiquiatria”
Saudações psicodramáticas para todos!
Saudações psicodramáticas para todos!
A teoria psicodramática Moreniana pode ser encontrada em diversos livros traduzidos e editados no Brasil. O maior psicodramatista vivo é o brasileiro Alfredo Soeiro, que vai estar amanhã, dia 9 de Novembro, na Lousã, no XI congresso da Sociedade Portuguesa de Psicodrama.
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